Capital Humano


Nas últimas três décadas, as organizações brasileiras, tanto privadas como públicas, de forma crescente passaram a se conscientizar da importância da revisão dos seus modelos de gestão: no caso das empresas privadas, a motivação era a sua sobrevivência e competitividade no mercado; no caso das empresas públicas, tal motivação era a sua capacidade de cumprir sua missão, ou seja, atender com qualidade a prestação de serviços de interesse da sociedade.
Ao mesmo tempo, focando a realidade empresarial brasileira, constata-se que as organizações nacionais, tanto públicas como privadas, já desenvolvem esforços no sentido de recuperar o tempo perdido (de pelo menos duas décadas) que levou a um atraso em relação à situação mundial. No entanto, se há poucas empresas brasileiras consideradas de "classe mundial", já é possível avaliar a partir destas a aplicabilidade das novas práticas gerenciais que garantirão a sua sobrevivência num mercado cada vez mais globalizado e competitivo.
Este contexto gerou um esforço, às vezes de forma frenética, de busca de novos modelos de gestão empresarial. De outro lado, à medida que novas idéias e práticas gerenciais surgiam, eram apresentadas, pelos seus proponentes (geralmente empresas de consultoria empresarial) como a solução dos desafios gerenciais e, eventualmente, recebidas pelo meio acadêmico e empresarial como "modismos". Assim, idéias e práticas novas, como Qualidade Total, Reengenharia, Gestão Participativa, Terceirização e Alianças Estratégicas, entre outras, precisaram contar com o tempo para ficar claro que as organizações adequam os seus modelos de gestão muito mais por um processo de evolução contínua do que por rompimento ou substituição dos conhecimentos gerenciais.
Em termos do desenho organizacional, os modelos estão evoluindo em três estágios: num primeiro momento, a estrutura é hierarquizada no sentido vertical (modelos tradicionais); num segundo momento, a estrutura continua hierarquizada, porém em menor número de níveis hierárquicos e passa a ter um desenho mais horizontalizado, através de estilos mais participativos e empreendedores de gestão (Administração Japonesa, Participativa e Empreendedora). Finalmente, percebe-se que as organizações caminham no futuro para serem parte de uma rede de pequenas organizações, interligadas por interesses comuns (Administração Holística e Corporação Virtual).
um aspecto comum aos novos modelos de gestão é que cada um deles foi importante na introdução e disseminação de algumas práticas administrativas que, de alguma forma, já representavam esforços das empresas em gerenciar um recurso até então não reconhecido como um dos principais ativos: o conhecimento organizacional. Ao longo dos anos 90, este conjunto de práticas veio a se consolidar como a Gestão do Conhecimento.
Gestão do Conhecimento é o processo sistemático de identificação, criação, renovação e aplicação dos conhecimentos que são estratégicos na vida de uma organização. É a administração dos ativos de conhecimento das organizações. Permite à organização saber o que ela sabe.
A gestão do conhecimento leva as organizações a mensurar com mais segurança a sua eficiência, tomar decisões acertadas com relação a melhor estratégia a ser adotada em relação aos seus clientes, concorrentes, canais de distribuição e ciclos de vida de produtos e serviços, saber identificar as fontes de informações, saber administrar dados e informações, saber gerenciar seus conhecimentos. Trata-se da prática de agregar valor à informação e de distribuí-la.
Há alguns desafios a vencer na Gestão do Conhecimento: influenciar o comportamento do trabalhador, considerado o maior deles; fazer com que as lideranças da organização comprem a idéia; e, por fim, determinar como classificar o conhecimento.
A Gestão do Conhecimento nas organizações passa, necessariamente, pela compreensão das características e demandas do ambiente competitivo e, também, pelo entendimento das necessidades individuais e coletivas associadas aos processos de criação e aprendizado: De um lado, é evidente que estamos vivendo em um ambiente cada vez mais turbulento, onde vantagens competitivas precisam ser permanentemente reinventadas e onde setores de baixa intensidade em tecnologia e conhecimento perdem, inexoravelmente, participação econômica.
Neste contexto, o desafio de produzir mais e melhor vai sendo suplantado pelo desafio, permanente, de criar novos produtos, serviços, processos e sistemas gerenciais. Por sua vez, a velocidade das transformações e a complexidade crescente dos desafios não permitem mais concentrar estes esforços em alguns poucos indivíduos ou áreas das organizações.
São vários os aspectos relacionados à Gestão do Conhecimento: papel da alta administração, cultura e estrutura organizacionais, práticas de gestão de recursos humanos, impacto dos sistemas de informação e mensuração de resultados, alianças estratégicas etc. Esta abordagem reflete nossa compreensão de que a Gestão do Conhecimento implica, necessariamente, na coordenação sistêmica de esforços em vários planos: organizacional e individual; estratégico e operacional; normas formais e informais. Em particular, quando se fala em Gestão do Conhecimento é necessário discutir:
· O papel da alta administração na definição dos campos de conhecimento, no qual os funcionários da organização devem focalizar seus esforços de aprendizado, além do seu papel indispensável na definição de metas desafiadoras e na criação de culturas organizacionais voltadas à inovação, experimentação, aprendizado contínuo e comprometidas com os resultados de longo prazo e com a otimização de todas as áreas da empresa;
· As novas estruturas organizacionais e práticas de organização do trabalho, que diversas empresas, em diferentes setores e em diferentes países, estão adotando para superar os limites à inovação, ao aprendizado e à geração de novos conhecimentos, impostos pelas tradicionais estruturas hierárquico-burocráticas;
· Quais são as práticas e políticas de administração de recursos humanos associadas à aquisição de conhecimentos externos e internos à organização, assim como à geração, difusão e armazenamento de conhecimentos na mesma.
Neste sentido, os princípios básicos - em alguns casos a partir de práticas emergentes - que deveriam estar norteando as várias políticas e práticas de administração de RH (recrutamento e de seleção de pessoal, planos de carreiras, treinamentos e remuneração), visando:
- Melhorar a capacidade das organizações de atrair e de manter pessoas com habilidades, comportamentos e competências que adicionam aos estoques e aos fluxos de conhecimento (de valor) das mesmas;
- Estimular comportamentos alinhados com os requisitos dos processos individual e coletivo de aprendizado, assim como aqueles que resguardem os interesses gerais e de longo prazo da organização no que tange ao fortalecimento de suas "core competencies".
· Como os avanços na informática e nas tecnologias de comunicação estão afetando os processos de geração, difusão e armazenamento de conhecimento nas organizações. A associação na literatura entre tecnologia de informação e gestão do conhecimento está relacionada ao uso de sistemas de informação para o compartilhamento de informações ou conhecimento.
A Gestão do Conhecimento centra-se em três aspectos principais: foco nos ativos intangíveis (principalmente o fator humano), tornar a gestão do conhecimento algo explícito, incentivar e criar mecanismos que facilitem aos funcionários o compartilhamento de seus conhecimentos.
Em particular, várias tecnologias que podem ser empregadas para este fim: intranets, groupware, document management systems, data warehouses, desktop-videoconferencing, electronic bulletin boards etc. Além disso, estas ferramentas podem ser classificadas em três grandes áreas:
- repositório de materiais de referência: conhecimento explícito que pode ser facilmente acessado e que evita duplicações de esforços;
- expertise ex maps: banco de dados com listas e descrições das competências de indivíduos de dentro e de fora da organização. Isto facilitaria o compartilhamento de conhecimento tácito;
- just-in-time knowledge: ferramentas que reduzem as barreiras de tempo e distância no acesso a conhecimentos (: videoconferência).
O tratamento mais analítico do conhecimento nas organizações públicas, entretanto, de suas principais questões, continua a representar importantes desafios:
- Como mapear o conhecimento (competências individuais) existente nas organizações?
- Como facilitar e estimular a explicitação do conhecimento tácito dos funcionários?
- Como utilizar os investimentos em informática e em tecnologia de comunicação para se aumentar o conhecimento da organização e não apenas acelerar o fluxo de informações?
- Como atrair e selecionar pessoas com as requeridas competências, habilidades e atitudes?
- Que sistemas, políticas e processos devem ser implementados para moldar comportamentos relacionados ao estímulo à criatividade e ao aprendizado?
- Como manter o equilíbrio entre o trabalho em equipe e o trabalho individual e entre o trabalho multidisciplinar e a requerida especialização individual?
Quando se pensa em Gestão do Conhecimento há uma superposição na direção das análises "micro" (indivíduos e grupos), "meso" (organização) e "macro" (ambiente). Reconhece-se, assim, que o aprendizado e a criação individual incluem a capacidade de combinar diferentes inputs e perspectivas, que o aprendizado organizacional demanda uma visão sistêmica do ambiente e a confrontação de modelos mentais distintos e, finalmente, que o processo de inovação requer, crescentemente, a combinação de diferentes habilidades, conhecimentos e tecnologias de campos distintos do conhecimento.
Assim, esperemos, mesmo que timidamente, caminhar para uma valorização dos ativos intangíveis na gestão da Área de Planejamento 4, entendendo que o que há de mais valioso numa organização é seu capital humano.